“O Brasil é contra metas. Defendemos a adopção de objectivos mensuráveis, quantificáveis e verificáveis dentro do âmbito da Conferência (das Nações Unidas) para os países em desenvolvimento. Esperamos que em Bali se desenvolvam processos nesse sentido”, defendeu o principal negociador brasileiro na Conferência de Bali, o embaixador Everton Vieira Vargas.
O subsecretário-geral do Ministério das Relações Exteriores disse aos jornalistas, que a discussão sobre as mudanças climáticas é um dos principais temas da política externa brasileira porque o assunto "é uma questão estratégica para o Brasil".
Vargas reiterou a posição contrária do Brasil à adopção de metas de redução de emissão para países em desenvolvimento, em resposta ao relatório divulgado na semana passada (27 Novembro 2007) pelo PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), que sugere a diminuição, até 2050, de cerca de 20% das emissões das nações em desenvolvimento e cortes de 80% no caso dos países ricos. Actualmente, apenas países desenvolvidos têm metas obrigatórias de redução, definidas no âmbito do Protocolo de Quioto.
Segundo o embaixador, o Brasil defende apenas a ampliação das metas de redução para os países desenvolvidos, além de maior comprometimento desses países com a transferência de tecnologia e recursos para travar o aquecimento global também nas nações em desenvolvimento. “Não podemos ter o mesmo tipo de compromisso que as nações industrializadas”, acrescentou.
Assim, a participação brasileira na Conferência das Partes da Convenção do Clima (COP-13), em Bali, na Indonésia, será marcada pelo incentivo à criação de um mecanismo internacional de financiamento de políticas públicas para redução de emissões de gases de efeito estufa nos países em desenvolvimento.
Segundo o embaixador, a expectativa brasileira é de que os mais de 180 países da Convenção fixem prazos para a negociação do segundo período de cumprimento do Protocolo de Quioto. “Esperamos também um mapa para a criação de um órgão negociador a fim de iniciar a discussão e a negociação de compromissos de adoção de políticas públicas para países em desenvolvimento que levem à redução de emissões mediante apoio financeiro e transferência de tecnologia”, especificou.
Como o Brasil negocia em bloco nas decisões da ONU, as sugestões brasileiras ainda precisam ser aprovadas pelo G-77, o grupo que reúne 133 países em desenvolvimento. “"Teremos de fazer um esforço para construir o consenso no G-77", avaliou Everton Vieira Vargas.
A delegação brasileira em Bali será chefiada pelos ministros das Relações Exteriores, Celso Amorim; da Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende; e do Meio Ambiente, Marina Silva.

Francisco Ferreira (Quercus em Bali)
(comunicado da Quercus a 2 de Dezembro)
1. A 13ª Conferência das Partes (COP-13) e o Mandato de Bali: a urgência de reduções reais de emissões de gases de efeito de estufa
As negociações internacionais na COP-13 são cruciais para garantir que após 2012 se consiga a continuidade e ampliação das metas do Protocolo de Quioto, bem como o fortalecimento de medidas, programas e iniciativas políticas e económicas compatíveis com a Convenção das Nações Unidas para as Alterações Climáticas. O Segundo Período do Protocolo deve prosseguir o uso dos mecanismos existentes, a começar pela exigência de reduções internas das emissões de gases de efeito de estufa nos países desenvolvidos.
Para impedir impactos climáticos catastróficos não é possível adiar decisões. Por isso, A Quercus e as demais organizações da Rede Internacional de Acção Climática defendem que na COP-13 em Bali se adopte um conjunto de decisões, o Mandato de Bali, que contemple pelo menos os seguintes elementos:
a) 2009 deve ser o prazo máximo para concluir as negociações sobre o Segundo Período de Compromissos (CP-2) do Protocolo de Quioto;
b) A meta de redução efectiva de emissões de gases de efeito estufa dos países desenvolvidos deve ser pelo menos 30% até 2020, com base nos níveis de emissão de 1990;
c) As emissões globais acumuladas (totais dos países desenvolvidos e em desenvolvimento) devem começar a reduzir a partir do período 2015-2020. Este objectivo requer que metas, instrumentos e programas considerem cortes absolutos de emissões nos períodos subsequentes, de forma a que até 2050 possam haver reduções de 60%-80% nas emissões nos países desenvolvidos, que permita alguma margem para emissões em alguns países em desenvolvimento.
d) O fortalecimento e ampliação dos mecanismos e meios, inclusive financeiros, para a expansão da implementação de medidas e programas de adaptação às mudanças climáticas, inclusive mediante assistência técnica, transferência de tecnologia, perdão de dívidas, cooperação financeira ao desenvolvimento, especialmente para os países menos desenvolvidos.
e) O estímulo para que países de industrialização recente (ex: Singapura, Coreia) sejam integrados no Anexo B do Protocolo de Quioto, com compromissos de redução, alargando o total das reduções de emissões no planeta.
f) Um processo para negociar mecanismos que assegurem e apoiem a redução de emissões de gases de efeito estufa mediante a redução da desflorestação de florestas tropicais.
g) Inclusão dos sectores de aviação e transporte marítimo e suas respectivas fontes de gases de efeito estufa no Anexo A do Protocolo de Quioto, que lista os sectores abrangidos;
h) Revisão científica que inclua um novo compromisso de redução ao nível global;
i) Ampliação da área de trabalho do Grupo de Trabalho Ad-hoc (AWG) no âmbito do Protocolo de Quioto para os países do Anexo I (países desenvolvidos), para discutir compromissos após 2012, para além de explorar a possibilidade de compromissos diferenciados e formas de enquadramento dos países fora do Anexo I (países em desenvolvimento), de modo que esses possam evoluir e aumentar suas acções para atender o regime global.
Um insucesso nas negociações representaria um retrocesso de mais de uma década na construção de um regime multilateral sobre mudanças climáticas. Tal insucesso implicaria poucas hipóteses de evitarmos mudanças climáticas catastróficas para o planeta.
2. O papel dos países desenvolvidos
É necessário que os países desenvolvidos continuem o progresso na taxa de redução das suas emissões domésticas. Para o período pós 2012 são necessárias metas de redução muito mais ambiciosas, por parte dos países desenvolvidos, de redução das suas emissões em 30% até 2020 e 60%-80% até 2050.
Os países desenvolvidos precisam também de fornecer recursos e tecnologias de forma continuada aos países em desenvolvimento para que estes consigam fazer um esforço de limitação e redução de emissões de gases de efeito estufa, para além de fornecer recursos para a adaptação aos impactos das alterações climáticas, especialmente para os países menos desenvolvidos e mais vulneráveis.
3. As responsabilidades e acções dos países em desenvolvimento
Como afirma a Convenção das Alterações Climáticas, os países em desenvolvimento, conforme as suas responsabilidades e capacidades devem adoptar políticas de desenvolvimento sustentável que levem à redução das emissões de gases de efeito estufa, adicionais aos esforços dos países desenvolvidos, para contribuir com o esforço global de redução das emissões. O princípio de responsabilidades comuns, mas diferenciadas da Convenção das Alterações Climáticas é pertinente e pretende alcançar a equidade e distribuição mais justa de custos e tarefas para lidar com a mitigação das emissões e no apoio à implementação de medidas de adaptação aos impactos das mudanças climáticas.
A aplicação deste princípio deve ir além da distinção de tarefas e compromissos entre países desenvolvidos e países em desenvolvimento. É moralmente necessário e politicamente justo pretender que o mesmo princípio possa permitir a diferenciação entre países em desenvolvimento, uma vez que há situações muito distintas entre estes ao nível das taxas de industrialização e crescimento económico. Tais diferenças são avaliadas quando se considera a contribuição, recente e potencial no futuro, para o aquecimento global e emissões de gases de efeito estufa dos países em desenvolvimento.
O primeiro passo é reconhecer a vasta gama de circunstâncias nacionais e de níveis de emissão nos países em desenvolvimento, e aceitar que países não listados no Anexo 1 (países considerados desenvolvidos) não podem mais ser tratados como um grupo indistinto no que diz respeito a contribuições para a mitigação de emissões significativas. Também é necessário abrir uma discussão sobre diferentes tipos de compromissos e outras contribuições para países em desenvolvimento com emissões substanciais e crescentes – incluindo a entrada no Anexo 1/B de alguns países recém-industrializados com altas taxas de emissão e crescimento económico (como a Coreia do Sul, Singapura e o Kuwait, por exemplo).
A definição de compromissos e contribuições deve ser baseada em critérios como igualdade, responsabilidade e capacidade de reduzir emissões. Um grande obstáculo à protecção do clima seria solucionado abandonando-se de uma vez por todas o paradigma do ambiente versus desenvolvimento, e passando-se a levar em conta de forma séria a necessidade de mudar fundamentalmente esse paradigma e encontrar novos caminhos para conciliar as necessidades de desenvolvimento sustentável, mantendo baixos os níveis de emissão de carbono.
Países com economias e situações ambientais relevantes, entre eles China, Índia, Brasil, África do Sul e Indonésia, não podem iludir os seus habitantes nem esquivar-se nas negociações internacionais, e devem enfrentar os desafios para a promoção de medidas consistentes com a protecção do sistema climático global no contexto de políticas de desenvolvimento sustentável, tal como previsto na Convenção das Alterações Climáticas. Isto requer abrir um canal no regime multilateral para negociações internacionais que possam criar condições e objectivos específicos para a situação e capacidades de certos grupos de países em desenvolvimento.
É importante que esse canal seja construído a partir da COP-13 em Bali, uma vez que nos próximos anos o planeta vai requerer também a estabilização e a diminuição relativa das emissões de alguns países em desenvolvimento, além do corte substancial das emissões de países industrializados, para que o planeta possa ter um nível de menor risco de eventos catastróficos ao nível climático. Esse canal de negociações deve estar ligado ao regime, e não deve ser limitado a um simples processo de diálogo.
Lisboa/Bali, 2 de Dezembro de 2007
A Direcção Nacional da Quercus - Associação Nacional de Conservação da Natureza

Francisco Ferreira (Quercus em Bali)
Conferência das Nações Unidas tem de definir objectivos consensuais mas exigentes para acordo em 2009 que garanta forte redução de emissões após 2012
(comunicado Quercus de 30 de Novembro)
A importância da Conferência das Nações Unidas em Bali
Tem início na próxima segunda-feira, dia 3 de Dezembro (prolongando-se até 14 de Dezembro), em Bali na Indonésia, a 13ª Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas para as Alterações Climáticas. A Conferência de Bali conta com a participação de 13.000 participantes de todo o mundo entre representações oficiais, organizações não governamentais e comunicação social.
A Conferência ocorrerá a dois níveis – a reunião de todos os países signatários da Convenção (a denominada COP13), e o Encontro das Partes (a denominada MOP3), que reúne os países que assinaram e ratificaram o Protocolo de Quioto (não participando assim países como os Estados Unidos da América e a Austrália).
As negociações internacionais da COP-13 em Bali serão cruciais já que devem garantir que após 2012 tenhamos a continuidade e ampliação de metas do Protocolo de Quioto e o fortalecimento de medidas, programas e iniciativas políticas e económicas compatíveis com a Convenção das Alterações Climáticas. Um insucesso nas negociações representaria um retrocesso de mais de uma década na construção de um regime multilateral sobre mudanças climáticas. Tal insucesso implicaria poucas hipóteses de evitarmos mudanças climáticas catastróficas para o planeta.
As expectativas da Quercus para Bali
O relatório do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC) deste ano não deixa margem para dúvidas: evitar uma perigosa mudança climática é tecnológica, social e economicamente possível e benéfica. Mas o tempo para agir é extremamente curto se os países que fazem parte do Protocolo de Quioto quiserem cumprir o compromisso assumido de evitar as alterações climáticas. Evitar os efeitos dramáticos de uma mudança climática significa ficar a baixo de um aumento de temperatura global abaixo dos 2ºC. Isto significa que o pico máximo de emissões de gases de efeito de estufa tenha de ser atingido antes de 2015.
Os compromissos conseguidos em Bali e a negociar nos próximos dois anos são cruciais para conseguirmos abraçar um desenvolvimento sustentável. Se não o conseguirmos teremos de enfrentar os impactes das alterações climáticas descritos no mesmo relatório do IPCC.
A prioridade desta COP e COP/MOP é a de acordar os elementos chave e uma agenda de negociações para que seja atingido um acordo pós 2012. A Quercus e as demais organizações da Rede Internacional de Acção Climática querem que na conferência de Bali sejam iniciadas as negociações para um acordo pós 2012 com compromissos adequados para lidar com os enormes desafios das alterações climáticas – o Mandato de Bali.
Este Mandato de Bali tem de estabelecer uma rigorosa agenda para um acordo pós 2012 seja conseguido em 2009, na conferência de Copenhaga. É essencial que as negociações sejam conseguidas para o pós 2012 e que seja enviado um sinal claro para o futuro do mercado global de carbono.
Os elementos necessários do Mandato de Bali em nosso entender são os seguintes:
- Revisão científica que inclua um novo compromisso de redução ao nível global;
- Reforço dos compromissos de redução dos países que ratificaram o Protocolo de Quioto;
- Expansão da lista de países com metas de redução incluindo novos países industrializados e também EUA e Austrália;
- Critérios justos e transparentes para redução de emissões dos países com compromissos de redução de emissões assumidos (Anexo I)
- Novos instrumentos para conseguir novos incentivos para a participação de países em desenvolvimento que não estão no Anexo I
- Critérios justos e transparentes de tipos e diferenciação de acções para os países em desenvolvimento
- Desenvolvimento de um mecanismo que garanta regulares e fiáveis incentivos á redução de emissões da desflorestação e degradação florestal nos países em desenvolvimento
- Revisão das regras sobre as modalidades de contabilização das emissões associadas ao uso do solo e à mudança do uso do solo e floresta
- Revisão do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo que assegure uma mais-valia ambiental e que ajude a atingir uma redução significativa no pós 2012
- Assegurar que os países em desenvolvimento mais vulneráveis têm acesso ao suporte financeiro necessário à adaptação aos efeitos das alterações climáticas
- Assegurar um regime de comprometimento com as metas assumidas
- Revisão científica da metodologia adoptada.
A Quercus em Bali
A Quercus será a única organização não governamental de ambiente portuguesa presente nesta Conferência através de Francisco Ferreira, Vice-presidente da Quercus, a partir de 1 de Dezembro (como membro da delegação portuguesa, à semelhança do que tem sido possibilitado às associações de ambiente em conferências desta natureza durante a Presidência Portuguesa da União Europeia pelo Governo Português) e Ana Rita Antunes, coordenadora na Quercus das áreas da energia e alterações climáticas (a partir de 8 de Dezembro). A Conferência inclui nos três últimos dias um segmento ministerial com a presença de Ministros e/ou Secretários de Estado do Ambiente dos quase duzentos países participantes, para além de uma reunião dos Ministros e/ou Secretários de Estado das Finanças no dia 11 de Dezembro.
A Quercus manterá durante a conferência um BLOG com pormenores da negociação, curiosidades, fotos e vídeos recolhidos pelos participantes da Quercus em http://bali.blogs.sapo.pt/.
A presidência portuguesa
A União Europeia tem liderado as negociações climáticas a nível mundial e o papel da presidência portuguesa em Bali é vital para que assim continue. Este processo negocial não pode ficar refém da sistemática recusa da administração americana em fixar metas obrigatórias para os países desenvolvidos. Apesar das negociações que irão começar em Bali só terminarem em 2009 é necessário, para que esta reunião seja bem sucedida, definir uma direcção clara e exigente do caminho que será seguido até lá e não apenas um vago conjunto de intenções que deixe toda a negociação para mais tarde.
Lisboa, 30 de Novembro de 2007
A Direcção Nacional da Quercus - Associação Nacional de Conservação da Natureza